sábado, 4 de abril de 2020

E TOME TANGO



Tango 

A música de uma cidade

de Mauro Mendes Braga


Coleção: Humanitas
2014. 500p. 
Dimensão: 22,5 x 15,5
Peso:730 gramas

Este livro traz uma visão panorâmica do nascimento e desenvolvimento do tango e de sua íntima relação com a cidade de Buenos Aires. Apresentam-se as diferentes etapas de evolução do tango, bem como breves histórias de seus personagens e canções mais destacados. O texto, direcionado ao público brasileiro, aborda também o impacto que o tango teve no Brasil e sugere temas e gravações para uma pequena discoteca do gênero.

 Música triste de uma cidade

OBRA DE MAURO BRAGA CONTA A HISTÓRIA DO TANGO, MOSTRANDO COMO O GÊNERO ESTÁ IDENTIFICADO COM BUENOS AIRES

POR ITAMAR RIGUEIRA JR.


 O bandoneon, instrumento de origem alemã e sacra, chegou à Argentina no quarto final do século 19 e foi incorporado ao tango por volta de 1910. Incapaz de acompanhar o ritmo vivaz dos primórdios da música portenha – quando lembrava o choro brasileiro –, o bandoneon associou-se à nostalgia dos imigrantes italianos, dotando o tango de sua alma melancólica. Essa e outras histórias encontram-se no livro Tango – a música de uma cidade, que a Editora UFMG lançou na semana passada em Belo Horizonte.
Fruto de trabalho – movido por paixão que vem da infância – do professor Mauro Braga, aposentado do Departamento de Química da UFMG, o livro conta a história do tango desde o início do século 20 até por volta dos anos 1970. O autor dedica boa parte do texto a mostrar por que o ritmo é considerado essencialmente portenho, nascido nos conventillos (espécie de cortiços) de Buenos Aires e marcado por um idioma próprio, o lunfardo, resultado da mescla de culturas que caracterizou a capital argentina no começo do século 20.
O livro aborda a origem negra do tango, relacionada ao grande contingente de negros que habitou Buenos Aires e Montevidéu por mais de 200 anos. Candombe e milonga, ritmos negros, foram se transformando e incorporando contribuições de italianos e criollos. A alma melancólica do gênero se consolida com o aparecimento do tango-canção, em 1917, ou seja, as canções que contavam uma história triste.
Mi noche triste, de Samuel Castriota e Pascual Contursi, – cuja letra foi escrita por Contursi sem o conhecimento do autor da música – é unanimemente considerada a primeira dessas canções e foi também o primeiro tango gravado por Carlos Gardel. O tango foi se tornando uma música triste, fortemente ancorada na vida da cidade. Muitos anos depois, o músico Osvaldo Pugliese chegou a defini-lo como “o livro de queixas do arrabal portenho”.

SUCESSO EM PARIS

A pesquisa que construiu Tango – a música de uma cidade incluiu várias incursões a Buenos Aires – uma das temporadas durou três meses – e a leitura de mais de cem obras. O livro mostra ainda que o tango, originalmente música de prostíbulos e dos conventillos, foi levado por jovens de classe alta para os bordéis de luxo da cidade e, logo em seguida, para Paris.
“O sucesso do tango em Paris alimentou a absorção do gênero pelas classes abastadas, desejosas da sofisticação que o gosto francês conferia”, diz Mauro Braga, que descreve em seu livro as etapas, com duração de aproximadamente duas décadas, em que se divide parte da história do tango, desde 1880: as Guardias Primitiva, Vieja, Nueva e del 40.
O texto segue até o reinado de Astor ­Piazzolla, figura “exótica e enigmática”, que chegou a imaginar que preferia o jazz e o piano à combinação do tango com o bandoneon. Após uma temporada de estudos em Paris, entretanto, concluiu que sua vida estava no tango e no bandoneon. Como disseram dois de seus biógrafos, “Piazzolla percebeu que a sombra que queria deixar para trás era a sua”.
O livro aborda apenas superficialmente o desenvolvimento do tango após 1980, mas Mauro Braga garante que o estilo tem presença muito forte ainda hoje em Buenos Aires. “Mantém-se como aspecto importante a releitura de temas antigos, o que foi acentuado pelo aparecimento de notáveis cantoras, nos anos de transição do século 20 para o 21. Mas novos valores estão aportando ao gênero contribuições que o enriquecem”, afirma Mauro Braga, que produz e apresenta o programa Compasso Latino, na Rádio UFMG Educativa.

Na parte final da obra, há um capítulo dedicado aos poetas do tango – entre os quais se destacam Catullo Castillo, Enrique Cadícamo, Enrique Discépolo, Alfredo Le Pera, Homero Manzi, Homero Exposito, Eladia Blazquez e Horacio Ferer – e outro que relaciona cem tangos considerados pelo autor essenciais a uma discoteca. Devoto também do bolero e da música cubana, que ouvia junto com a música portenha nas eletrolas da família, Mauro diz que escolheu o ritmo para começar porque sente falta de obras sobre o tema em português e porque lhe pareceu mais viável a pesquisa. E, embora inicie sua obra ressaltando a “ousadia” da empreitada – “não sou historiador, nunca estudei literatura e nem sei distinguir uma nota musical de outra” –, admite que poderá se “aventurar” outras vezes a escrever sobre sua paixão pela música latina. 

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